segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Pesquisador da UFF pede apoio ao presidente Lula às propostas não contempladas no Edital Universal

"O que acontecerá com os 10.300 projetos que não serão financiados? Como os pesquisadores destes projetos conseguirão manter funcionando os seus laboratórios, orientar os seus estudantes de iniciação científica, mestrado e doutorado?"

Leia a carta aberta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, assinada por Luiz de Gonzaga Gawryszewski (gawryszewski.lg@pq.cnpq.br), pesquisador do Departamento de Neurobiologia da Universidade Federal Fluminense (UFF):

"Excelentíssimo Sr. Presidente da República Federativa do Brasil
Sr. Luiz Inácio Lula da Silva,

Acompanhei as discussões sobre o clima em Copenhague e vibrei emocionado com seu (de V.Excia.) discurso claro, sincero e objetivo mas, infelizmente, impotente para a busca de um consenso que permitisse o estabelecimento de uma resolução com as metas imprescindíveis para garantir o futuro da Humanidade.

"Mutatis mutandis", um impasse semelhante está ocorrendo no Brasil, pois pesquisadores brasileiros das universidades públicas federais estão perplexos, pois vivem um momento de grande desespero e sentem-se impotentes para encontrar uma solução.

O Edital Universal é a principal fonte de Fomento à Pesquisa e à Tecnologia no Brasil para os grupos de pesquisa independentes. Recentemente, o CNPq publicou orgulhoso: "CNPq aprova mais de 2.700 projetos no Edital Universal 2009. Este ano, o Edital Universal recebeu cerca de 13 mil propostas, com uma demanda bruta de R$ 604,97 milhões" (sic).

Mas, o que acontecerá com os 10.300 projetos que não serão financiados? Como os pesquisadores destes projetos conseguirão manter funcionando os seus laboratórios, orientar os seus estudantes de iniciação científica, mestrado e doutorado?

Nas últimas semanas, o CNPq publicou duas outras notícias que me faz entrever a busca de uma solução para este impasse.

A primeira foi: "CNPq e Insa ampliam os recursos do Edital Universal-2009. O Instituto Nacional do Semiárido (Insa/MCT) se aliou ao CNPq para financiar projetos do Edital Universal 2009, não incluídos na lista dos inicialmente aprovados por aquele edital por limitação de recursos, mas que tinham sido recomendados por Comitês Assessores. São 13 propostas,...". Ou seja, diminuindo 13 de 10.300, só temos 10.287 à espera de uma solução.

A segunda notícia auspiciosa foi: "Resultados de editais divulgados esta semana somam R$ 77,8 milhões. Entre os dias 14 e 18 de dezembro, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico (CNPq/MCT) divulgou o resultado de dez editais."

O Edital 059/2009 selecionou 14 projetos; o Edital 069/2009, 10 projetos; o Edital 059/2009, 14 projetos; o Edital 2009/008, aprovou 23 projetos de pesquisa. O Edital 036/2009 beneficiou 15 projetos; o 2009/042, 26 projetos; o 2909/038, 16 projetos. Treze projetos foram aprovados no Edital 025/2009, e o Edital 033/2009 aprovou 114 propostas. Ou seja, 231 projetos foram aprovados recentemente.

Assumindo que todos estes projetos não foram aprovados no Edital Universal, ainda sobram, 10.056 projetos à espera de recursos. Não inclui no cálculo acima, os 287 projetos que correspondem aos eventos científicos e a uma soma de 20 milhões.

Em resumo, em uma semana, o CNPq divulgou auxílios a 231 projetos, totalizando um total de 57,8 milhões, ou seja, mais da metade dos recursos destinados ao Edital Universal (100 milhões) em todo o ano de 2009.

Em 19 de março de 2004, escrevi à V.Excia uma carta aberta dizendo que: "O Governo FHC implantou um sistema perverso de financiamento da pesquisa que permitiu propagandas dizendo que bilhões de reais estavam sendo investidos na Ciência Brasileira, gerando produtos de alto impacto internacional. Todavia, ao mesmo tempo, a maioria dos laboratórios de pesquisa estava sem receber um tostão. Infelizmente, duas medidas impediram que esta propaganda fosse criticamente avaliada e debatida.

1- Os fundos setoriais - Muitas análises foram feitas comparando os recursos financeiros dos fundos setoriais e suas demandas com os recursos do CNPq e a demanda da comunidade nacional dos pesquisadores. Assim, vários pesquisadores receberam montantes vultosos dos fundos setoriais para as suas pesquisas e, realmente, não tinham porque reclamar...

2- O CNPq - Muitos tiveram um grande amor pelo antigo CNPq. Existiam duas chamadas para financiamento a cada ano e anualmente os recursos para o CNPq aumentavam um pouco ou muito, mas tendendo sempre a crescer ao longo do tempo. E isto desde a fundação do CNPq que foi comemorada há pouco. O que mudou? Do meu ponto de vista, mudou a comunidade científica que não compreendeu que era fundamental preservar o CNPq e resolveu se arriscar em novos mares. Seriam estes mares, o Pronex foi o primeiro, que trariam novos recursos. Isto não ocorreu como prometido e os recursos previstos não foram repassados tal como contratados. Mais recentemente, criou-se o Milênio. Em todos esses casos, as idéias são excelentes e grupos de pesquisadores altamente competentes foram financiados..." (sic). Principalmente, os beneficiados recentemente nos novos Institutos Nacionais.

Desta forma, considero fundamental restituir o prestígio do CNPq atribuindo-lhe os recursos necessários para que ele recupere as responsabilidades que lhe couberam na época de sua fundação e que ele manteve até o período anterior ao Governo FHC. Ou seja, uma agência de fomento com recursos orçamentários que seja capaz de financiar um número significativo das pesquisas em andamento. (sic)

V. Excia. bem sabe quão importante é uma mão-de-obra qualificada e quanto custou ao Brasil formar pesquisadores com mestrado, doutorado e, muitas vezes, pós-doutorado no exterior, os quais necessitam, ao menos, de recursos mínimos para manter o laboratório em funcionamento.

V. Excia. também sabe quão triste e prejudicial ao Brasil seria se esta mão-de-obra qualificada desistisse de reivindicar o seu direito ao trabalho para o qual foi treinada e/ou decidisse deixar o Brasil. (sic)

Desta forma, como acredito que para formar grandes craques de futebol são necessários muitos campos de fundo de quintal e para se formar cientistas são necessários muitos laboratórios com condições mínimas de funcionamento em todas as Universidades Federais, Estaduais e particulares (aquelas com pesquisas relevantes em andamento), mas não acredito em Papai Noel, solicito urgência em uma medida proposta por V.Excia. que restitua a dignidade aos 10.056 projetos de pesquisa apresentados ao Edital Universal em 2009 que não foram financiados.

Parabenizando novamente V. Excia. pelo lindo e emocionante discurso em Copenhague e pelo "exitoso" final de seu governo, que muito contribuiu para o desenvolvimento do nosso Brasil, coloco-me à vossa disposição para o que se fizer necessário."


FONTE: Jornal da Ciência (JC E-Mail)
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Edição 3918 - Notícias de C&T - Serviço da SBPC

Um comentário:

  1. muito bem colocado o tema pelo nosso colega. Parece que os ditos orgãos de "fomento" esqueceram-se do significado da palavra FOMENTO. Nas instancias de avaliação os grupos se articulam para abocanhar os poucos recursos que são direcionados e os pesquisadores e seus laboratorios que não possuem tal capacidade de articulação ficam a mingua.

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