quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

SBPC e ABC repudiam proposta de corte no orçamento de C&T

Em carta divulgada nesta terça-feira (21/12), entidades manifestam preocupação com possível corte de R$ 610 milhões, a título de reserva de contingência, na Ciência e Tecnologia

Leia a íntegra da carta, assinada pelos presidentes da SBPC, Marco Antonio Raupp, e da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Jacob Palis Junior:

"É com imensa preocupação que a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) avaliam a proposta de corte de R$ 610 milhões, a título de reserva de contingenciamento, no orçamento do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) para 2011, conforme prevê o substitutivo ao Projeto de Lei Orçamentária que está sendo discutida pelo Congresso Nacional.

Esse valor representa a expressiva marca de quase 10% dos gastos com as atividades-fim (exceto pessoal e dívida) do MCT para o ano que vem, o que poderá causar danos, muitos deles irreparáveis, em vários e importantes projetos de pesquisa que estão sendo realizados em todo o país, nas mais diversas áreas do conhecimento.

Prejudicar o andamento de trabalhos de pesquisa é um grave problema. Mais grave ainda, porém - e aqui residem as maiores preocupações da SBPC e da ABC -, é que qualquer redução no investimento público em ciência e tecnologia (C&T) representará um passo atrás no desenvolvimento econômico e social do país.

Cada vez mais a ciência é fator de desenvolvimento das nações, e o Brasil vem caminhando nessa direção. Num espaço de apenas 20 anos, a participação da ciência brasileira na ciência mundial passou de 0,62% para 2,4%, o que coloca o Brasil em 13º lugar no ranking do setor.

A qualidade dos trabalhos publicados por nossos cientistas tem experimentado avanço semelhante, conforme atestam fontes internacionais independentes. Nos últimos anos houve um crescimento de cerca de 20% na média de citações de artigos de pesquisadores brasileiros em relação à média mundial, que se concentra nos países cientificamente mais desenvolvidos.

Essa evolução da ciência brasileira decorreu de uma política de Estado que fez investimentos continuados e crescentes por várias décadas - e em especial nos últimos anos - na formação de recursos humanos para o ensino superior e para a pesquisa e na produção de conhecimento.

Assim, esta política precisa ser consolidada e ampliada, em vez de sofrer reveses. Somente a produção de conhecimento, o seu uso na geração de riqueza, a consolidação da cultura da inovação e a solução dos desequilíbrios sociais e regionais possibilitarão que o Brasil seja incluído entre os países desenvolvidos na próxima década.

Sociedade Brasileira de Física (SBF) manifesta-se contra cortes em C&T e Educação

Entidade apela a parlamentares para que instituam prática de corte zero nessas áreas

Leia carta assinada pelo presidente da SBF, Celso P. de Melo, e encaminhada à senadora Serys Slhessarenko, relatora do Orçamento:

"Senhora Senadora,

Em nome da Sociedade Brasileira de Física (SBF), associação científica que reúne mais de 6 mil profissionais com atuação nas áreas de ensino, pesquisa e inovação, e que sempre esteve à frente na defesa das bandeiras de construção de um Brasil mais forte, justo e soberano, venho expressar minha perplexidade e indignação diante das notícias de que cortes estariam sendo propostos no Orçamento da República para o ano de 2011, afetando seriamente as áreas de Educação, Ciência e Tecnologia.

Já de algum tempo a SBF vem defendendo a ideia de que a ciência brasileira atingiu o patamar crítico para ser considerada como um efetivo instrumento de transformação de nossa sociedade. O Brasil tem nas próximas décadas uma preciosa e última janela de oportunidade de se afirmar perante o mundo como uma nação moderna, crescendo de maneira forte e de modo a, enfim, incorporar milhões de brasileiros em sua cidadania plena. E isso há de ser feito com mais, e não com menos, educação, ciência e tecnologia.

Educação, para resgatarmos a dívida histórica com nosso povo, de inclusão social através de uma educação pública de qualidade em todos os níveis, o que requer - além de recursos diretos - a continuidade de uma política de investimentos na formação de recursos humanos qualificados.

Ciência, para que os problemas especificamente brasileiros, de que são exemplos o desenvolvimento sustentável da Amazônia, e o de nosso mar e recursos costeiros, e a eliminação ou controle das doenças neglicenciadas e/ou ressurgentes, entre outros, possam ser enfrentados com a incorporação do mais avançado conhecimento científico em disciplinas novas e de fronteira, como a nanotecnologia, a biotecnologia e as tecnologias convergentes. Ao mesmo tempo, é preciso não descurar, mas ao invés, consolidar, os grandes avanços já alcançados em diversas áreas, que fazem com que o Brasil, hoje, tenha uma presença científica de crescente destaque mundial.

Tecnologia, enfim, para nos permitir saltos de qualidade na solução de problemas de uma sociedade em transição, em que as questões de mobilidade urbana e logística de transportes, controle da violência e defesa da soberania, a melhoria da saúde e, até mesmo, a necessidade da disseminação das práticas esportivas entre a juventude dependem cada vez mais de soluções técnicas inovadoras, que podem ser aqui desenvolvidas, com emprego de nossa gente, cada vez mais bem capacitada.

Custa crer que sejam verdadeiras as notícias de que, hoje, em um país que enfim se põe de pé em condições de mirar seu próprio futuro, estejam em cogitação cortes no orçamento que incidam sobre essas áreas portadoras do amanhã tão desejado.

Apelo a V.Exa. e a seus nobres colegas, para que - com os corações e mentes voltados para o futuro - assegurem neste mês de dezembro de 2010 a confiança na transformação profunda deste país, que só se fará com a preservação e continuidade das políticas de educação, ciência e tecnologia. Que o Congresso Nacional tome a decisão histórica de instituir uma prática de CORTE ZERO EM EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA!"

Burocracia torna a ciência brasileira menos competitiva, avalia Rezende

Ministro da C&T faz balanço de gestão de mais de cinco anos e diz que meta deve ser fortalecer cultura de pesquisa em empresas

O físico carioca Sérgio Rezende deixará em 31 de dezembro o MCT (Ministério da Ciência e Tecnologia), que esteve sob seu comando por mais de cinco anos.

Em entrevista exclusiva à Folha, ele reconhece que, apesar dos avanços de sua gestão, a burocracia ainda é um dos grandes inimigos dos cientistas brasileiros. Também defendeu a escolha do petista Aloizio Mercadante como seu sucessor: "Certamente pode ter um papel de influência no governo". Leia os melhores trechos da conversa:

- O sr. está saindo de uma gestão considerada positiva. Isso é raro...

Eu só espero que as pessoas não fiquem com saudades de mim [risos]. Tivemos mais recursos e, acompanhando isso, uma atuação mais forte do governo federal em incentivar e apoiar a pesquisa e inovação nas empresas. Isso é uma mudança grande. Nossa política científica sempre foi desvinculada da política industrial - que, por sua vez, teve seus altos e baixos. Não havia acontecido até agora uma articulação entre ciência e indústria. Estamos aprendendo a fazer isso, mas avançamos muito.

- Ter 1,3% do PIB destinado à ciência é suficiente?

Passar de 1% foi mudar de patamar. Tínhamos planejado chegar a 1,5% do PIB e chegamos a 1,3%. No entanto, em números absolutos, nós atingimos a meta, porque o PIB do Brasil cresceu muito e continua crescendo.

- Mas qual seria o ideal?

Os países desenvolvidos têm em média 2,5% do PIB investido em ciência. Mas esses países têm muito mais cientistas: são dois cientistas para cada 10 mil habitantes. Nós temos um pesquisador para 10 mil pessoas. Se tivéssemos mais recursos, eles não seriam utilizados. Precisamos formar mais gente, e isso é um processo gradual. A ideia é que a gente chegue a 2022 com dois pesquisadores para cada 10 mil habitantes e com 2,5% do PIB em ciência.

- Ainda há barreiras por parte de quem acha que dinheiro público não deve ser gasto com ciência nas empresas?

Existe um pouco. Essas vozes estão ficando isoladas. Felizmente nós estamos passando dessa fase. Há 20 anos se dizia que o dinheiro público deve ficar na universidade e que empresa não deveria fazer pesquisa. Dizia-se que ciência não combina com lucro. Isso é uma bobagem. Esse tipo de crítico também costuma dizer que não dá para fazer "Big Science" [ciência cara e de grande porte] num país que ainda tem gente passando fome. A ciência feita com intensidade, com aplicações, contribui de maneira eficaz para resolver os problemas sociais. O melhor exemplo que temos é da Coreia do Sul, a qual, na década de 1970, era mais subdesenvolvida que o Brasil. Eles investiram em tecnologia e inovação e, com isso, o país tirou milhões de pessoas da pobreza.

- Qual foi o principal desafio da sua gestão?

Nós tivemos um problema com o excesso de burocracia. Alguns desvios que aconteceram em fundações de amparo à pesquisa fizeram o TCU [Tribunal de Contas da União] tornar a execução de recursos muito mais difícil. Hoje a burocracia é um dos entraves para a realização da atividade de pesquisa no Brasil de maneira mais tranquila. É uma burocracia para se usar os recursos, para explicar como usou. Um cientista brasileiro enfrenta muito mais burocracia do que um europeu para fazer o mesmo trabalho, e isso diminui a competitividade. Nós conseguimos simplificar o procedimento de importação, mas ainda é bem mais difícil um pesquisador daqui comprar um equipamento de fora do que um pesquisador de outro país. Nos outros lugares é assim: o pesquisador quer comprar um equipamento para fazer uma pesquisa e compra. Aqui não pode, tem sempre de fazer licitação e comprar o mais barato. Eu decidi sair antes do resultado da eleição. Estou há dez anos consecutivos em atividade de gestão. No momento, quero me dedicar à atividade científica e não à gestão. A gestão do cotidiano, dos problemas, das pessoas, das confusões - isso é algo que desgasta. Nós demos um salto no MCT, e eu acho que não conseguiria dar novo salto. Precisamos de novas ideias.

- Mas o sr. já foi convidado para administrar alguma outra instituição?

Sim, já tive mais de um convite. Mas já disse que não quero mais ter atividade executiva nos próximos anos. Estou indo para Pernambuco [na UFPE]. Estou envolvido em nanotecnologia de materiais magnéticos, já tenho alguns trabalhos. Há dois pós-doutores publicando resultados interessantes, e estou sem tempo de me juntar a eles, de entender o problema, de fazer teoria. Pode ser que em dois anos em volte à gestão, mas agora eu quero ser cientista.

- Aloizio Mercadante será um bom ministro no seu lugar?

Ele tem tudo para ser um bom ministro. É uma pessoa de visão larga, certamente pode ter um papel de influência no governo.
(Folha de SP, 21/12)

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

R$ 360 milhões para infraestrutura de pesquisa

Finep lança nova edição do edital Proinfra

A Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) lançou a chamada pública que destina R$ 360 milhões voltados para projetos de implantação, modernização e recuperação de infraestrutura física de pesquisa em instituições públicas de ensino superior e pesquisa.

A chamada MCT/FINEP/CT-Infra/Proinfra - 01/2010 conta com recursos não reembolsáveis (que não precisam ser devolvidos) originários do FNDCT - Fundo Setorial CT-Infra.

Cada instituição executora poderá participar em apenas uma proposta, que deverá conter um diagnóstico institucional que identifique suas vocações e competências, sua disponibilidade de recursos humanos e materiais, suas atividades de pós-graduação e/ou de pesquisa, o estágio atual do desenvolvimento da pesquisa e sua inserção no contexto de C&T, em consonância com os desafios da sociedade brasileira.

O Formulário para Apresentação de Proposta deve estar disponível dia 23 de dezembro. O prazo para submissão de propostas vai até 24 de março de 2011.

O último edital do Proinfra, lançado em dezembro de 2009, também ofereceu R$ 360 milhões.

Mais informações em:
(Com informações do Portal da Finep)

MPF move ação contra 20 docentes da Unifesp

Investigados pelo TCU desde 2003, professores teriam quebrado regime de dedicação exclusiva e causado prejuízo de R$ 1,4 milhão

O Ministério Público Federal (MPF) entrou com três ações civis públicas por ato de improbidade administrativa contra 20 professores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Eles são acusados de desobedecer o regime de dedicação exclusiva da instituição, exercendo atividades remuneradas que não são autorizadas por contrato - como atender em consultórios particulares e dar aula em outras universidades.

O MPF calcula que, ao todo, o prejuízo causado pelos professores seja de R$ 1,4 milhão. Para exercer as atividades remuneradas fora do regime acadêmico, nenhum dos professores teria solicitado uma prévia autorização da Unifesp. O Tribunal de Contas da União investiga a conduta dos professores desde 2003.

Nessas ações, consta que 9 dos 20 docentes também se dedicaram "à gerência, administração ou representação técnica de sociedades comerciais", atividades proibidas pelo Estatuto do Servidor Público Federal.

Como pena pela violação, os procuradores da República Sergio Suiama e Sônia Maria Curvelo sugerem que os docentes sejam condenados a ressarcir o dano financeiro à instituição. Além disso, devem perder seus cargos, ter os direitos políticos suspensos por até dez anos, pagar multa de até três vezes o valor recebido ilegalmente e ser proibidos de trabalhar em cargos públicos por dez anos.

Por meio de nota, a Unifesp afirmou que desde que foi notificada pelo TCU, em 2003, tem descontado nos holerites dos docentes as quantias indevidas. O texto também afirma que o TCU mandou interromper esses descontos, solicitando à universidade que "apurasse as situações em processos administrativos específicos". A mesma orientação foi dada pelo Tribunal Regional Federal (TRF).

A Unifesp diz que existem processos administrativos disciplinares em andamento para a apuração das denúncias e que a instituição "não pode ser responsabilizada por atos pessoais de seus servidores". A universidade também se coloca à disposição para esclarecimentos.

Para o presidente do Sindicato dos Médicos do Estado de São Paulo e da Federação Nacional dos Médicos, Cid Carvalhaes, os docentes devem cumprir o que está no contrato. "Se foi firmado que o regime é de dedicação exclusiva, isso deve ser cumprido."

O Conselho Federal de Medicina e o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo não comentaram o assunto. O CFM afirma esperar o resultado das apurações e que, no momento, não há nenhum processo aberto junto ao conselho sobre o tema. O Cremesp diz não conhecer o processo e que, por se tratar de questões administrativas e não ligadas ao exercício da Medicina, não se manifesta.
(Mariana Mandelli)
(O Estado de SP, 21/12)